Bem-vinda ao cérebro do seu filho!

Bem-vinda ao cérebro do seu filho!

O cérebro é uma das estruturas mais intrigantes e complexas do corpo humano. Ao longo de toda a vida este órgão passa por inúmeras transformações, especialmente durante a primeira infância, altura em que o cérebro recebe uma série de estímulos que podem ser centrais no desenvolvimento da criança.

 

Até há algum tempo atrás, acreditava-se que o cérebro dos bebés começava o seu desenvolvimento apenas após do nascimento. Felizmente, a evolução da ciência permite-nos afirmar com segurança que a situação não é bem assim. Na verdade, o bebé recebe estímulos sensoriais e ambientais desde a gestação que já irão influenciar o seu desenvolvimento. Ainda dentro do útero, o bebé começa a experimentar sensações e a reconhecer sons da fala humana, ruídos do ambiente e até luzes fortes.

 

No período intrauterino, o cérebro começa a desenvolver-se entre a segunda e terceira semana após a conceção, seguindo com a formação das primeiras células cerebrais, os neurónios, e as conexões entre os neurônios chamadas sinapsesNão é incrível?!

 

Pouco a pouco, durante os 3 primeiros anos de vida, o cérebro das crianças cresce aproximadamente 80%. Para além disso, e embora o cérebro humano seja considerado maduro apenas a partir dos 21 anos, 90% das conexões neurais são estabelecidas até os 6 anos de idade.

 

Imagem adaptada de Shonkoff J, Phillips D (Eds.) From Neurons to Neighborhoods: The Science of Early Childhood Development. Committee on Integrating the Science of Early Childhood Development, Board on Children, Youth, and Families, Commission on Behavioral and Social Sciences and Education, National Research Council and Institute of Medicine. Washington, DC: The National Academies Press; 2000.

Por isso, quanto mais estímulos as crianças receberem nesta fase, melhor será a sua preparação para o futuro. Embora o cérebro seja plástico o suficiente para absorver aprendizagens até o fim da vida, o ritmo diminui após a primeira infância como vemos no gráfico acima. Por isso, experiências positivas desde o início da vida contribuem muito para o desenvolvimento saudável das crianças.

A Teoria do Cérebro Trino

Na década de 1960, o neurocientista americano Paul MacLean formulou a “Teoria do cérebro trino” que se baseia na divisão do cérebro humano em três regiões distintas de uma forma evolutiva:

Cérebro Reptiliano

Cérebro Emocional (Límbico)

Cérebro Racional (Neocórtex)

 

Segundo MacLean, a organização hierárquica do cérebro humano representa a aquisição gradual das estruturas cerebrais através da evolução. Este modelo sugere que os gânglios da base são adquiridos numa primeira fase, acreditando-se serem responsáveis ​​pelos nossos instintos mais primitivos. De seguida encontra-se o sistema límbico que é responsável pelas nossas emoções. E, depois, o neocórtex (ou cérebro racional) que se acredita ser responsável pelo pensamento racional ou objetivo.

  • MacLean afirma que a atividade nas três regiões do cérebro depende da situação que estejamos a vivenciar. Por exemplo, quando estamos em perigo e somos obrigados a responder rapidamente, a estrutura reptiliana é acionada preparando-nos para a ação. Esta região, responsável pelos nossos instintos e perceções mais primitivas, como o medo, o sono, a fome, a sobrevivência, a defesa e o ataque, a ação/reação, é formada e desenvolvida durante a gestação. Isso significa que quando nascemos ela vem completamente formada e maturada.
  • Por outro lado, quando assistimos a uma notícia chocante ou recebemos uma mensagem perturbadora, é o sistema límbico que é estimulado provocando a libertação de substâncias químicas que criam a nossa experiência emocional.
  • Finalmente, quando estamos perante uma situação em que somos obrigados a tomar decisões, a resolver problemas ou a raciocinar, a parte do cérebro acionada é o neocórtex. Curiosamente, esta região só acaba de se formar por volta dos 21 anos (alguns neurocientistas apontam para a possibilidade desta região só estar completa, em alguns indivíduos, aos 29 anos!), o que nos permite compreender a incapacidade que por vezes as crianças têm de se autorregularem, de pensarem criticamente e de forma lógica ou de tomarem decisões ponderadas. Esta região do seu cérebro não está, simplesmente, desenvolvida e maturada ao ponto de o conseguirem fazer sempre.

Quão atual é esta teoria?

Os últimos avanços no estudo do cérebro mostraram que é possível as várias regiões do cérebro serem simultaneamente ativadas durante experiências primárias, emocionais e racionais. Ou seja, elas não funcionam de forma independente umas das outras (como referiria McLean), mas em interligação. Estas descobertas levaram à rejeição da teoria proposta por MacLean de um cérebro trino desconectado.

 

No entanto, embora o modelo seja, uma simplificação exagerada do funcionamento do órgão, a Teoria permite-nos uma compreensão básica que nos ajuda a ser mais empáticos e compreensivos com o comportamento das crianças. Afinal de contas, elas nem sempre têm a capacidade para analisar e avaliar riscos como gostaríamos que tivesses, pois o neocórtex ainda não está completamente desenvolvido, mas têm capacidade para reagir de uma forma instintiva pois essa região cerebral (reptiliana) é formada e maturada logo durante a gestação.